cubo mágico
Nasci um cubo mágico. Cada pecinha no lugar, vermelho com vermelho, azul com azul e por aí vai. Comecei a dar meus passos assim, completinha, sorridente, feliz.
Primeiro vieram meus pais. "Você não acha que seria melhor ter menos azul e mais amarelo aqui?" "Sim eu concordo". E com suas mãos me giraram e giraram e trocaram peças do lugar. Eu não sabia o que estava acontecendo então me deixei levar. O que pedaços de plástico colorido sabem em um mundo de mãos?
Depois veio a igreja. "Esse vermelho com vermelho não está certo, é coisa do inferno" e mais uma vez me giraram. Na escola "Verde com azul? Quem foi o burro que te misturou? Todo mundo sabe que verde é com vermelho" e me rodaram em suas mãos mais uma vez.
Acostumada a ir girando e misturando meus pedaços, fui vivendo a vida de mão em mão. Cada opinião, cada experiência alheia, cada mão me moldava e eu simplesmente aceitava.
Cresci. Envelheci. Cheguei na vida adulta e olhei para as pessoas ao meu redor. Cada cubinho arrumadinho com as cores corretas em cada lugar enquanto lá estava eu com elas todas misturadas sem saber o que fazer. Só me ensinaram a bagunçar o cubo mágico. E agora? Como faço para arrumar?
Dei mais uma girada e me misturei mais ainda. As peças pareciam que estavam ficando cada vez mais folgadas de tanto girar e girar. Algumas peças caíram e tive que colar de volta com cola super bond mas eu já não lembrava mais como era. "Essa peça é do lado da branca ou do lado da laranja? Mas qual laranja? A que está do lado do amarelo?".
Cada vez mais confusa, cada vez mais misturado, o cubo foi folgando, folgando, folgando. As peças cada vez mais caindo, caindo, caido. As mãos surpresas olhando para o meu cubo, seguiam indicando em qual direção eu deveria girar. "Você está diferente... talvez se girar mais uma vez resolva. Tenta misturar mais um pouco do amarelo com o branco. Não? Ixi então volta!".
Mas e eu lá sabia pra onde voltar? Será se eu deveria seguir me girando até as peças caírem de vez por causa das engenhocas cansadas e saturadas ou simplesmente aceitar que eu nunca voltaria a ser um cubo certinho e só aceitar viver assim?
Não sei. O que pedaços de plástico colorido sabem em um mundo de mãos?

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